domingo, 24 de abril de 2011

A Bahia de Diógenes Rebouças. "Da Catedral a Avenida"

Biografia: Um importante nome na construção de uma Salvador e Bahia Moderna.

Rafael Dantas.
História. Universidade Federal da Bahia.

Diógenes Rebouças.
Imagem: Arquivo Jornal A Tarde. Em Jeito Baiano*.

Como não olhar e ficar impressionado com uma obra de tamanho impacto como a Avenida Contorno. Não só ela como também a Fonte Nova, Hotel da Bahia, Escola Politécnica, Escola de Arquitetura da UFBA, Estação Rodoviária e a Marítima de Salvador. Entre outras, que fizeram de Diógenes Rebouças, um dos maiores nomes da arquitetura brasileira.
 
Baiano da cidade de Amargosa nasceu no distrito de Tartaruga - depois foi morar em Itabuna. Seu pai era cacauicultor com fazenda na região itabunese, o que acabou influenciado o filho, o jovem Diógenes, a ser engenheiro agrônomo, administrando o patrimônio da família. Mas, assim como a biografia de outros grandes artistas, não seria isso que Diógenes queria. Pelo contrário, desde aquela época o jovem Rebouças lia revistas de arte e tal gosto o levaria a projetar algumas casas e no futuro a Catedral de Itabuna de estilo eclético, seu grande projeto de expressão, construído entre 1935 e 1936 com colaboração de Ernani Sobral.
 
Em 1933 formou-se em Engenharia Agronômica na antiga Escola Agrícola da Bahia (hoje em ruínas). Em 1937 Desenho e Pintura na Escola de Belas Artes da Bahia e em 1952 Arquitetura e Urbanismo na Escola de Belas Artes da UFBA. Mas é em meados do século XX, mas precisamente na década de 40, que Diógenes Rebouças começa a ganhar maior destaque, já que novos rumos urbanísticos começam a ser pensados para a Cidade de Salvador depois dos já realizados na época de J.J. Seabra. Com isso participou do Escritório do  Plano de Urbanismo da Cidade de Salvador mais conhecido como EPUCS, sendo convidado por Mário Leal Ferreira que décadas mais tarde teria seu ousado plano usado¹ na gestão do prefeito Antônio Carlos Magalhães (1967 - 1971). Durante os anos de 1942 e 1951 participou do projeto do Estádio Octávio Mangabeira, conhecido como Fonte Nova, inaugurado em 28 de janeiro de 1951. E também coordenou os projetos da Avenida Centenário 1949, o Hotel da Bahia construído entre 1947 e 1952 com Paulo Antunes Ribeiro - tombado pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia em 2010, e a penitenciaria Lemos de Brito em 1951, na gestão do governador Octávio Mangabeira.
 
Em 1950 com o admirável Anísio Teixeira, liderou o plano que levaria a criação do Centro Educacional Carneiro Ribeiro, conhecido popularmente como Escola Parque. Durante os anos de 1952 e 1953 o Edifico do IPASE, e nos anos 1955 - 1957 o Edifício Comendador Urpia.
Foi consultor técnico do segundo distrito do IPHAN na Bahia por 5 anos. E em 1952 depois da consultoria no IPHAN foi contratado como professor da Faculdade de Arquitetura da UFBA ficando por mais de três décadas, tornando-se Catedrático em 1967. É válido lembrar que foi o primeiro presidente e co-fundador do Instituto dos Arquitetos do Brasil, secção Bahia.
Em 1960 foi o responsável pelos projetos da Escola Politécnica da UFBA na Federação (o antigo prédio ficava na Praça de São Pedro, já demolido). Em 1965 (obras iniciadas) o prédio da Escola de Arquitetura da UFBA com a colaboração do engenheiro Américo Simas, Oscar Caetano Silva e Fernando Fonseca. E nos anos de 1961 e 1962 a Estação Rodoviária e a Estação Marítima de Salvador na Cidade Baixa.

A Avenida Contorno.


Avenida Contorno, Salvador Bahia e o Solar do Unhão. Podemos ver os arcos que sustentam a Avenida. Em 13 de Outubro de 1962.
Imagem: Encontrada no site: Cronologia do Urbanismo.

 
Talvez um dos maiores exemplos da sua genialidade tenha sido o projeto da Avenida Contorno, onde fora preservado o conjunto arquitetônico do Unhão, entre 1952, 1958 - 1960, com a colaboração de Paulo Ormindo de Azevedo. Não poderíamos deixar passar esse exemplo da instalação do moderno entre o antigo - não destruindo o passado - sem pelo menos fazermos um comentário. Já há algum tempo o avanço das novas construções está passando de forma totalmente desequilibrada e desordenada sobre as antigas construções de Salvador.  Sem a devida valorização ou preservação, do que antes era considerado moderno ou símbolos do progresso, e atualmente está sendo tratado como “atraso” - para alguns. Dessa forma não só belos casarões, ou conjuntos arquitetônicos inteiros desaparecem, como também levam um pedaço importante da rica História visual da Cidade do Salvador.


Avenida Contorno, Salvador Bahia. E a Gamboa de Baixo.
20 de Outubro de 1962.
Imagem: Encontrada no site: Cronologia do Urbanismo.


É importante destacar que soma-se a seu currículo outros trabalhos que não foram listados aqui. Como a sede da Associação Atlética da Bahia (demolida) em 1941, várias residências e edifícios construídos entre as décadas de 30 e 60, o Museu Hansen Bahia em 1980 na cidade de Cachoeira (era consultor do IPHAN), restruturação e adaptação do Solar Berquó (sede do IPHAN Bahia) entre 1986 - 1988), Avenidas Bonocô e Miguel Calmon (Vale do Canela) em 1970, e a revitalização do Mosteiro de São Bento em 1994.

“O que Diógenes Rebouças não conseguiu salvar com a sua ação, salvou com os seus pincéis”.²
Cid Teixeira. 
 

Vale lembrar que Diógenes Rebouças também participou do conselho de cultura e arquitetura do Estado. E mencionar que foi aluno de importantes figuras das artes aqui na Bahia como: Prisciliano Silva e Pasquale de Chirico. E falando em arte, é autor de trabalhos belíssimos que retratou a cidade do Salvador em meados do século XIX. Suas obras são de grande valor artístico e cultural, pois além de retratar a cidade em cenas magníficas mostram um pouco do cotidiano em algumas telas. Fazendo suas pinceladas expandirem cor, simbolismo e História, retratando uma cidade que não pode ser mais vista atualmente, se perdeu infelizmente entre os escombros gerados pela dita "modernidade".
 
Por fim cabe a mim e a todos os cidadãos de Salvador agradecer a Diógenes de Almeida Rebouças, nascido e 7 de maio de 1914, falecido em 6 de novembro de 1994, pelo seu magnífico trabalho de preservação e modernização na capital baiana.

Em 2014 comemora-se o Centenário de Diógenes Rebouças.
Detalhes no site
Diógenes Rebouças.
 
Obras de Destaque: 
Antigo Estádio da Fonte Nova. Demolido.
Imagem: Encontrada em gurufilmes.wordpress.

Solar do Unhão e Avenida Contorno no fundo.
Imagem: Encontrada em Bloglog globo.
 

Algumas Telas de Diógenes Rebouças:
Antigo Elevador Lacerda antes da reforma da década de 30. E parte do bairro do Comércio.
Autor: Diógenes Rebouças.
Imagem: Postada por "Soteropolis1" encontrada no site Skyscrapercity.
 
 
Praça Tomé de Souza, ao fundo a antiga Sé que foi demolida em 1933.
Atualmente no canto esquerdo encontra-se a sede da Prefeitura de Salvador.
Autor: Diógenes Rebouças.
Imagem: Postada por "Soteropolis1" encontrada no site Skyscrapercity.
 

 
Nota:
1 Em governos anteriores a prefeitura de ACM (1967 - 1971) os projetos do Engenheiro Mário Leal Ferreira já tinham sido realizados, como a Avenida Centenário no Governo Mangabeira. Na gestão de Antônio Carlos Magalhães foram implantadas as famosas Avenidas de Vale que rasgaram a Cidade de Salvador usando como base os projetos de Ferreira.
2 Diógenes Rebouças (site do centenário)- Depoimentos: http://www.diogenesreboucas.com.br/depoimentos/ 

Referências e indicações:

Artigos:
GALVÃO, Ana. História do Fazer Moderno Baiano. Entrevista.
ANDRADE JUNIOR, Nivaldo Vieira. Arquitetura Moderna e Reciclagem do Patrimônio Edificado: a contribuição baiana de Diógenes Rebouças. 7° Seminário Docomomo, 22 de Outubro de  2007.
ANDRADE JUNIOR, Nivaldo Vieira. Diógenes Rebouças: Multiplicidade e Diversidade na Produção de Um Arquiteto Baiano. Fórum Patrimonio. Vol. 4, N° 2 (2011)
ANDRADE JUNIOR, Nivaldo Vieira. Diógenes Rebouças e o EPUCS: Planejamento Urbano e Arquitetura na Bahia, 1947 - 1950. Revista URBANA. V. 5, n° 6, 2013.


Outras fontes:
Diógenes Rebouças (site do centenário)- Depoimentos: http://www.diogenesreboucas.com.br/depoimentos/
Itaú Cultural - Diógenes: Rebouças: http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_IC/index.cfm?fuseaction=artistas_biografia&cd_verbete=8730&cd_idioma=28555&cd_item=1
Nublog: http://archive.today/xTn0F
Faculdade de Arquitetura UFBA - Histórico:
http://www.arquitetura.ufba.br/historico
Jeito Baiano Diógenes Rebouças*:
http://jeitobaiano.atarde.uol.com.br/?tag=diogenes-reboucas&paged=2
 

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*Atenção. A divulgação dos textos e imagens do Blog só pode ser feita com a devida referência do link, nome do autor dos artigos e nome do Blog. Atenciosamente Rafael Dantas.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Triste fim da Mansão Wildberger

Uma mansão ao chão.
Mansão Wildberger, hoje destruida. Desenho de Rafael Dantas
 
 
Para quem cruzava em frente à Igreja da Vitória e dava uma olhada para o que tinha atrás da Igreja, poderia perceber uma construção de estilo único em Salvador. Mas isso era possível há alguns anos atrás. Hoje que olha para os fundos da Igreja da Vitória, vê um terreno vazio com ainda algumas árvores, e um grande espaço entre elas, espaço este que antes era ocupado pela conhecida Mansão Wildberger, hoje infelizmente demolida.
Do marcante ano de 2007, data da demolição da Mansão, para 2012, outros casarões da região já deram adeus. Entre eles prédios em processo de tombamento, verdadeiras relíquias da arquitetura na capital baiana sendo demolidas. Tendo os bairros da Vitoria, Graça e Centro as principais localidades da febre demolidora.
Mas quem pensa que é só no corredor da Vitória que os últimos exemplares de construções do inicio e meados do século XX estão sendo demolidos, estão enganados. Em outros bairros de Salvador estamos perdendo casarios de importante valor arquitetônico e histórico. Na verdade todo esse absurdo coincide com o inicio da gestão do prefeito João Henrique, e com a falta de atenção dada pelo governador Jaques Wagner ao patrimônio Histórico de Salvador e da Bahia. O que antes era preservado e divulgado, hoje vive em constante ameaça. Se compararmos veremos que em governos anteriores, por exemplo o 3° governo de ACM e das prefeituras da época carlista, o patrimônio histórico e artístico aqui da Bahia, era mais bem conservado do que agora. Vejamos por exemplo o pelourinho que hoje está abandonado.

O caso da mansão Wildberger de Salvador é a prova de que a especulação imobiliária e o abandono dos bens arquitetônico de nossa capital são levados a níveis impensáveis. Em outra região de Salvador, também degradada, teremos a vinda da rede de hotéis Hilton, no Comércio. O projeto aponta a construção de uma torre maior do que todos os prédios do local, sem falar que a arquitetura da região, ainda do início do século passado terá a terrível companhia de um prédio coberto de vidro e aço. Nesse caso não teremos a união equilibrada do antigo com o moderno, e sim a adesão forçada do monstruoso prédio do Hotel, sobre o pouco do antigo que ainda restou no Comercio.

Absurdos como esses acontecem em todo o Brasil e temos que ficar atentos, ou será tarde demais no futuro para repararmos os erros do passado destruidor, daquilo que deveria ser preservado, mas que infelizmente é vendido e desprotegido às vezes intencionalmente.

Já foi publicado nesse mesmo blog um artigo atualizado e mais completo sobre a historia da Mansão Wildberger e sua demolição. O titulo: “A casa caiu”. Do tijolo da mansão, ao futuro concreto do arranha-ceu. Mansão Wildberger dos fundos da igreja, para o noticiario Brasileiro.(clique aqui)



A última Morada

O último Palácio dos Cardeais de Salvador.

Palácio Episcopal de Salvador, em desenho feito por Rafael Dantas
antes da construção do edifício
Imagem: Blog Rafael Dantas. Bahia/Desenho: Rafael Dantas.


Texto: Rafael Dantas.

Os erros do passado acabam se repetindo constantemente em Salvador, principalmente no que toca a preservação do patrimônio histórico. Ainda lembro do palácio Episcopal antes de sua “reforma”, ou hoje conhecido como Mansão dos Cardeais no Campo Grande, na verdade a "academia" ou salão de festas do gigantesco prédio que fica atrás do antigo casarão que cheguei a desenhar ainda no processo de construção do prédio de luxo.
Na época muitos olhavam e se perguntavam"será que o casarão que o Papa João Paulo II tivera ficado iria ser demolido?".
Os atuais usuários do palácio, moradores do Morada dos Cardeais, hoje percorrem, malham e realizam festas em um imóvel importantíssimo infelizmente desfigurado internamente. Durante décadas vários religiosos, políticos e personalidades, entre eles o próprio Papa João Paulo II, por ali passaram ou viveram.

Primeiro os azulejos brancos da fachada foram grosseiramente arrancados, dentro suas paredes decoradas, escadarias e tetos onde antes lustres de cristais tomavam a cena, agora davam lugar a picaretas e ferramentas, destruindo internamente o último grande casarão do Campo Grande.

Muitos pensavam que o casarão iria ser demolido como outros que existiam no Campo Grande e os vários solares e chalés do Corredor da Vitória. Mas os donos do empreendimento pretendiam dar aos seus futuros moradores nada mais nada menos que um palácio para servir de academia ou outra funcionalidade para os futuros condôminos. Foi assim que a obra andou e o casarão ficou, mas a torre que ficava atrás do palácio deu adeus a Baía de Todos os Santos para sempre. No fim o “monstro” (edifício) marrom de concreto voltado para o mar serviu de grande “cortina” para a bela paisagem que poderíamos ver antes no grande espaço entre os prédios na lateral do antigo palácio.
Hoje quem olha para a Praça do 2 de Julho não só vê o monumento com o Caboclo no topo, mas também o enorme prédio!
Monumento da Praça do Campo Grande ao 2 de Julho.
Antes e depois da construção do Edifício Morada dos Cardeais
e contraste com a paisagem
Imagem/montagem: Blog Rafael Dantas, Bahia.
Imagens encontradas nos sites: citybrazil e culturamix.
 
A construção do Morada dos Cardeais ocupou o último espaço livre no entorno da Praça do Campo Grande, contrastando com o monumento ao Dois de Julho com o caboclo no topo, inaugurado em 1895, que já foi o monumento mais alto da América do Sul com 25,86 metros de altura.

As inconsequentes transformação dos espaços urbanos da Cidade do Salvador infelizmente ameaçam constantemente o patrimônio histórico e as áreas verdes, essas cada vez mais fragilizados pedindo um triste e inerme socorro que um dia desaparecerá, afinal o que sobrou da “tchau” anualmente.
 
Os fundos do prédio voltado para o mar da Baía de Todos os Santos da
Mansão Morada dos Cardeais.
Antes próximo a piscina ficava uma pequena torre do Palácio dos Cardeais,
hoje demolida.
Imagem: Aratu Oline.

Vista do Edifício da praça do Campo Grande,
hoje o prédio domina a paisagem.
 
 
Imagens:
[1]Desenho Rafael Dantas.
[2]http://www.citybrazil.com.br/arquivos/imagens/pturisticos/pt_original_00014117.jpg
http://turismo.culturamix.com/blog/wp-content/gallery/monumentos-de-salvador/monumentos-de-salvador-8.jpg
[3]Encontrada no Site Aratu Online.
[4]Encontrada no site Skyscrapercity,

Um outro absurdo com o patrimônio de Salvador, a demolição da mansão Wildberger, está disponível em artigo nesse mesmo blog. “A casa caiu”. Do tijolo da mansão, ao futuro concreto do arranha-céu. Mansão Wildberger dos fundos da igreja, para o noticiario Brasileiro. (clique aqui).

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Antônio Carlos Magalhães, ACM - Entre o acrônimo e o epíteto.

Biografias: O poder a sombra de uma imagem. A formação do acrônimo ACM e alguns momentos da sua vida.

Antonio Carlos Magalhães sendo carregado por admiradores.
Imagem: Jornal Correio da Bahia.
Texto Rafael Dantas.

Por mais de 50 anos de vida pública entregues a política, ACM, como ficou conhecido um dos   políticos mais influentes do Brasil liderou um grupo político que ficaria conhecido como Carlismo¹. O grupo estabeleceu enorme poder na Bahia especialmente na década de 1990 e a imagem de ACM até hoje é relacionada ao imaginário de poder.
Tamanho poder estaria fixado em uma trajetória cercada de acertos e erros, com momentos que realçaram e muito três siglas (acrônimo), que estavam por trás de uma figura forte e extremante carismática, não mais presente, mas que ainda transita com força nos mais diversos cenários da História da Bahia e do Brasil; seja entre admiradores, adversários ou principalmente curiosos.
Biografia (Alguns momentos).

Em 4 de Setembro de 1927 em Salvador, nasceu Antônio Carlos Peixoto de Magalhães. Filho de uma família de classe média da capital baiana sem grandes expressões políticas, apesar do seu pai, Francisco Peixoto de Magalhães Neto ter participado da Assembleia Nacional Constituinte de 1934. Desde jovem demonstrou forte interesse nas atividades ligadas à política, principalmente durante o curso na Faculdade Medicina onde presidiu o DCE; antes, em 1944, foi presidente do grêmio no antigo Ginásio da Bahia. Nesse momento o jovem Antônio Carlos não poderia imaginar que décadas mais tarde se tornaria um dos personagens mais discorridos dos últimos tempos² - bem verdade que hoje esteja um pouco esquecido. Mas em seu auge (década de 90) Antônio Carlos Magalhães, em determinados momentos, era a própria "política" em pessoa. Era comum que jornalistas ligassem para ACM perguntando sobre alguma informação relevante no cenário político da época, muitos sabiam que revelações ou mesmo polêmicas iriam ser ditas pelo senador.

Antônio Carlos Magalhães (ACM)
em finais da decada de 60.
Imagem: Jornal Estadão -
sem autor disponível.
Até ser consagrado como o ACM trilhou um distinto caminho até ganhar em 1954 sua primeira eleição para Deputado Estadual apoiando Antônio Balbino de C. Filho, que tivera recebido o importante apoio do ex-governador e interventor da Bahia Juracy M. Magalhães. Em seguida foi eleito Deputado Federal em três mandatos 1958, 1962 e 1966.

Antes do início da vida política trabalhou no Diário de Notícias que era dirigido pelo poeta e jornalista Odorico Tavares, um dos seus grandes amigos, com forte ligação com o mundo das Artes. Nesse intervalo de vida entre o formado em Medicina e o político, Antônio Carlos Magalhães iria aos poucos delineando seus caminhos, amizades e alianças, que seriam essenciais em seus 79 anos de vida e em seus voos como político.


Luiz Viana Filho.
Imagem: Senado Federal.
 O ACM só apareceu quando Antônio Carlos teve a chance de se projetar para um número maior de pessoas, especialmente a frente da Cidade do Salvador. Em 1967 assumiu a Prefeitura da Cidade sob indicação do Presidente militar Castelo Branco. Enquanto isso Luís Viana Filho, professor de Direito e História do Brasil, biógrafo de Ruy Barbosa, Joaquim Nabuco e o Barão do Rio Branco, foi o primeiro governador empossado durante o regime militar na Bahia.


Otávio Mangabeira.
Imagem: M.R.E. 
Em quatro anos a frente da prefeitura, o ACM, começaria a por em prática um dos mais impactantes processos de reurbanização da História da Cidade do Salvador (sendo continuado na década de 1970) usando como base os projetos do engenheiro Mario Leal Ferreira. Seriam construídas rasgando o solo da velha capital baiana, entre outras obras, as novas Avenidas de Vale, interligando e expandido a Cidade em diversos pontos. Tais projetos aproveitaram os vales como meio viável de construção e locomoção urbana. Lembrando que em governos anteriores foram construídas obras de grande importância que também aproveitaram os vales, por exemplo, no mandato do Governador Otávio Mangabeira (1947-1951) com a construção da Avenida Centenário, projeto do arquiteto baiano Diógenes Rebouças. Pedro de Almeida Vasconcelos autor do livro: Salvador Transformações e Permanências (1549-1999), aponta que o  período entre os anos de 1945 - 1969 correspondeu ao início da aceleração da expansão populacional e espacial de Salvador, lembrando que na década de 1940 tivemos o surgimento do importante EPUCS.

 Governos e um Ministério fariam parte da sua trajetória política nos anos seguintes, o que iria aos poucos consolidado sua força política na Bahia. Considerado por alguns estudiosos como uma figura de personalidade forte que unia pragmatismo e paixão - fixado com o carisma e o poder concentrado em sua imagem - tornou-se Governador da Bahia durante o regime militar (1971-75), já que tivera apoiado o golpe de 1964. As ações do primeiro governo voltaram-se para a modernização da Cidade do Salvador, com a criação do Centro Administrativo da Bahia e da Avenida Paralela, além de outras avenidas como: o Vale do Canela (1974), Vale dos Barris (1975) e a Suburbana (1971). Atentou-se também ao crescimento do Centro Industrial de Aratu ampliando as negociações com o governo federal militar e empresários, para construção do Polo Petroquímico de Camaçari³.
Com o fim do primeiro governo de ACM, também por via indireta, inicia-se o governo do médico e professor Roberto Figueira Santos até 1979. Durante esse momento Antônio Carlos Magalhães foi presidente da Eletrobrás (1975-78) e membro do Conselho da Itaipu Binacional nos anos de 1976-78.

Novamente governador da Bahia (1979-83) Antônio Carlos volta-se para o interior do estado destacando-se a valorização do Oeste baiano, abertura de estradas e distribuição da rede elétrica nas cidades. Ainda como governador, no governo do General João Baptista Figueiredo (1979-85), ACM filia-se ao PDS, partido que sucedeu a ARENA com o fim do bipartidarismo, e apoia a realização no Centro de Convenções de Salvador, do XXXI Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) que tinha sido proibido nos governos militares. 
Em 15 de novembro de 1982 foi empossado o último governador do período militar na Bahia, escolhido por ACM em substituição a Clériston Andrade que fora vitimado por um acidente aéreo, João Durval Carneiro.

Com o retorno à legalidade democrática em 1988, Magalhães é escolhido no Governo José Sarney, Ministro das Comunicações entre 1985-1990. Na Bahia em 1987, é eleito o primeiro governador por via direta depois da ditadura, o advogado Waldir Pires, derrotando o candidato ligado a ACM Josaphat Marinho. 
ACM Senador. Sentado na velha cadeira
do Senado Federal.
Imagem: Revista Istoé - sem autor disponível.
Dessa vez por voto popular, ACM é eleito Governador pela terceira vez na Bahia (1991-94), realizando entre outros feitos, a revitalização do Pelourinho. A década de 1990 significou o auge de Magalhães e do seu grupo político. 
Licenciou-se do Governo da Bahia para ser Senador da República a partir de 1995. Como senador o fato mais traumático foi a morte do seu filho Luís Eduardo Magalhães em 1998 - antes tivera perdido sua filha Ana Lúcia Maron de Magalhães.  Um mês depois assumiu durante oito dias interinamente a Presidência da República na gestão de Fernando Henrique Cardoso. Entre os anos de 1997/1999 e 1999/2001, foi presidente do Senado. No entanto o novo milênio representou sérios abalos em sua vida política, inicialmente no cenário federal e posteriormente na Bahia. Em 2001 renunciou por causa do escândalo da violação do painel do Senado, ganhando a eleição para Senador no ano seguinte, sendo empossado em fevereiro de 2003. E Na Bahia em 2006, depois de 16 anos seguidos de Carlismo, Jaques Wagner é eleito governador. 
Antônio Carlos Magalhães morreu como senador em 20 de Julho de 2007.
"Só duas siglas pegaram neste país: JK e ACM".   
Antônio Carlos Magalhães.

 Seria sua reconhecida trajetória política (motivo de acaloradas discussões), uma destacada capacidade de prever os acontecimentos da sua época (assegurando a sua permanência no poder),  um perfil que em vários casos não fugia de questões consideradas polêmicas e a particular e sempre exaltada paixão pela Bahia (marca registrada dos seus discursos e campanhas), que acabariam transformando Antônio Carlos Magalhães na própria personificação do político ou mesmo dos ditames da política na sua época; sempre marcando presença entre adversários e admiradores. Conseguiu atravessar e se projetar durante a ditadura militar e manter-se com força em plena redemocratização em relação íntima com o poder, chegando a se destacar no cenário federal. Cada vez mais o respeito, temor, admiração, feitos, amizades ou inimizades, fariam de ACM um dos personagens mais enigmáticos ou mesmo"mitológicos" da Bahia contemporânea. Que não pode ser explicado por olhares apaixonados ou carregados de ódio, e sim analisado cuidadosamente.

Se utilizarmos a definição de epíteto que é quando alguma palavra ou frase defini ou  qualifica alguém, engrandecendo ou não um personagem, podemos considerar que as siglas ou acrônimo A.C.M. em diversos momentos acabaram sendo associadas a inúmeras interpretações sobre o político baiano. Em vários episódios não só carregavam a clara referência a Antônio Carlos Magalhães, como também o qualificava de acordo com a situação ou o seu legado para a Bahia. Imediatamente três simples letras juntas ultrapassavam a "categoria" de um acrônimo e poderiam virar um epíteto a depender da opinião do interlocutor. De uma forma de outra Antônio Carlos Magalhães foi eternizado como ACM.

Para alguns o Toninho Malvadeza, para outros o Toninho Ternura, e para muitos o ACM. Retirando-o das extremidades temos  o Antônio Carlos Magalhães e é assim que devemos tentar analisa-lo, sem exageros.
 
Antônio Carlos Magalhães em uma das suas
últimas entrevistas, 12 de fevereiro de 2007.
O Senador morreria cinco meses depois em
20 de Julho de 2007.
Imagem: Celso Junior/Agência Estado. 
 Certamente Antônio Carlos Magalhães e seu inegável legado mesclando conservadorismo e modernização na Bahia e no Brasil, merecem uma análise mais detalhada. Indicamos entre diversas e sérias pesquisas existentes os trabalhos do Doutor em Ciências Políticas Paulo Fábio Dantas Neto e a biografia de ACM escrita por José Batista Mattos. Entre as inúmeras entrevistas concedidas por Antônio Carlos Magalhães destaca-se a que virou um livro: Política é Paixão pela Editora Revan.


___________________________________
¹ "Carlismo" designa o grupo político baiano, que já teve projeção nacional e enorme poder na Bahia, diretamente relacionado a figura de Antônio Carlos Magalhães. O termo "Carlismo" deriva do segundo nome do político baiano Carlos.
² Para mais informações sobre o Carlismo indica-se os trabalhos do Doutor em Ciências Políticas e professor da Universidade Federal da Bahia Paulo Fábio Dantas Neto. Dantas Neto é autor de: Tradição, Autocracia, e Carisma: A politica de Antônio Carlos Magalhães. 
³ Ver TAVARES, Luís Henrique Dias. História da Bahia. Editora UNESP, EDUFBA, Salvador Bahia. 2001.

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Referências:

TAVARES, Luís Henrique Dias. História da Bahia. Editora UNESP, EDUFBA, Salvador Bahia. 2001.

RISÉRIO, Antônio. Uma História da Cidade da Bahia. Editora Versal, Rio de Janeiro 2004.

VASCONCELOS, Pedro de Almeida. Salvador: Transformações e Permanências (1549-1999). Ilhéus: Editora Editus, 2002.

Outras fontes:

Portal do Senado.
http://www.senado.gov.br/senado/grandesMomentos/acm.shtm
Eletrobrás:
http://www.eletrobras.com.br/Em_Biblioteca_40anos/presidentes.asp
Ministério das Comunicações:
http://www.mc.gov.br/galeria-de-ministros-institucional
Jornal Estadão, especial sobre ACM:
http://www.estadao.com.br/infograficos/conheca-a-trajetoria-de-acm,1153.htm
Imagens:
[1]http://www.correio24horas.com.br/detalhe/noticia/instituto-que-sera-lancado-hoje-reune-acervo-historico-de-acm/
[2]http://www.estadao.com.br/infograficos/conheca-a-trajetoria-de-acm,1153.htm
[3]www.senado.gov.br
[4]www.itamaraty.gov.br
[5]http://www.istoe.com.br/assuntos/entrevista/detalhe/28667_SERRA+SERIA+UM+ERRO+
[6]http://noticias.terra.com.br/brasil/fotos/0,,OI48176-EI306,00-Relembre+em+fotos+a+trajetoria+de+ACM.html


- Texto atualizado em Junho de 2014 -
*Atenção. A divulgação dos textos e imagens do Blog só pode ser feita com a devida referência do link, nome do autor dos artigos e nome do Blog.
Atenciosamente Rafael Dantas.