sexta-feira, 21 de junho de 2013

Manifestação Salvador. Memórias do 20 de Junho de 2013.

A quinta feira poderia acabar em paz. Porém além da beleza da manifestação, a repressão e depredação marcaram presença.
Manifestantes no Campo Grande, antes de começar a passeata rumo a Fonte Nova. Ainda nesse momento tínhamos um Campo Grande de paz. Ao anoitecer a realidade era outra.
Imagem: Teo Henrique | Ag. A TARDE.


Texto: Rafael Dantas, Bahia.
História UFBA.


Quando chegamos ao Campo Grande (eu e mais alguns amigos) percebemos a dimensão do protesto, principalmente na região em frente ao Teatro Castro Alves em direção a Avenida Sete de Setembro. Mais ou menos depois das 15 horas começamos a caminhar em direção a Fonte Nova, em um clima te total harmonia, cantando o Hino Nacional e outros gritos de protestos. A presença de grupos representando partidos políticos (PSTU e PSOL, que eu vi) não foi bem recebida nesse momento; e muitos manifestantes vaiaram tais grupos, mas sem nenhum ato de agressão. (Clique nas imagens para ampliar)
Mapa do percurso da Manifestação Passe Livre Salvador.
Imagem: Blog Rafael Dantas, Bahia
 
Quando a multidão passou em frente à Rua Politeama de Baixo grande parte dos manifestantes desceram em direção aos Barris (para chegar a Fonte Nova) enquanto outra parte foi caminhando pela Avenida Sete. Chegando à Avenida Joana Angélica o que aconteceu foi uma verdadeira guerra. Mas não estava lá (fui para os Barris) fiquei sabendo por amigos. Algumas pessoas falaram que infiltrados tentavam prejudicar a manifestação. E representantes de partidos políticos tentavam tomar a liderança do protesto. 
Confronto entre a Polícia e os Manifestantes na Avenida Joana Angélica.
Imagem: Eduardo Martins | Ag. A TARDE.

Ainda sem nenhum tumulto, em um clima de total paz, quem desceu pelo Politeama (grande parte dos manifestantes) chegou ao Vale dos Barris, passando próximo a Primeira Delegacia. Seguimos em direção ao Dique do Tororó. Logo depois da delegacia começamos a visualizar a dimensão da manifestação. Divulgaram 20 mil pessoas, mas acredito que deve ter ultrapassado 40 mil manifestantes, ou quem sabe mais. Percorrendo toda a Avenida Vale dos Barris, chegamos a Praça João Mangabeira (onde ficam umas quadras de futebol) e continuamos em frente.
A manifestação que até então era caracterizada pela paz, foi drasticamente direcionada para atos de repressão pela polícia, que impediu os manifestantes que seguiam para o Dique. Os manifestantes que conseguiram ir além da Praça João Mangabeira, foram impedidos pela policia Militar e Cavalaria. Foi o inicio de cenas absurdas.
http://www.youtube.com/watch?v=GOnEOSnLbwg&hd=1
Vídeo You tube. Renan Santos"Passe Livre Salvador".
 
 
Ainda estava na Praça, ao lado de umas das quadras com mais dois amigos, quando ouvimos o estrondo das bombas e a fumaça tomando todo o lugar. Milhares de manifestantes começaram a voltar para o Vale dos Barris correndo, e outro grupo dispersou para a Avenida Centenário. Foi uma multidão, e o desespero tomou conta da situação. Essas primeiras ações da Policia Militar, conseguiram fazer com que os manifestantes recuassem, e boa parte deles voltaram para o Vale dos Barris; enquanto outros ficaram e tentaram seguir em direção ao Dique. Os que ficaram na região próxima a Praça sofreram com as bombas, as balas de borracha, o gás lacrimogêneo e o spray de pimenta. Os que correram, voltando para o Vale, tiveram que enfrentar o nevoeiro de gás lacrimogêneo que o vento trazia. Muitos manifestantes correram em direção aos Barris, enquanto outros continuavam descendo pelo Politeama. Durante horas essa foi a situação da manifestação, ficando clara a atitude desnecessária da PM, tratando os manifestantes de uma forma absurda.
À medida que mais bombas, gás e tiros de borracha eram disparados contra os manifestantes, o recuo ficava claro. Mas a maioria dos manifestantes persistiram e tentaram por diversas vezes furar o bloqueio, sendo reprimidos com mais gás de pimenta, bombas e tiros de borracha. Em determinado momento um grupo de manifestantes conseguiu fazer com que a cavalaria recuasse.  
Voltando para o Vale dos Barris decidimos seguir novamente em direção ao Dique, mas logo fomos impedidos pela polícia, e o tumulto se generalizou. Refugiamos-nos temporariamente nos matos que ladeiam a avenida, próximo a um córrego e um outdoor. Enquanto algumas pessoas subiam as escadarias que levam ao Garcia.
Sem poder continuar, voltamos para o Vale. Nesse momento percebemos os primeiros atos de depredação, e por mais que a maioria dos manifestantes repudiassem os atos, inclusive pedindo para que não fizessem, ou mesmo vaiando; alguns dos envolvidos continuaram.
Vídeo - Gás lacrimogênio no Vale dos Barris - Repórter Silvia Resende. Ibahia.

Mais uma vez voltamos para o Vale, e decidimos voltar em direção a Praça na expectativa de chegar ao Dique. Chegando à Praça, não coseguimos continuar. Uma nuvem de gás lacrimogêneo, que parecia pimenta, fez com que a maioria recuasse. Nesse momento sentimos realmente, de forma muito mais intensa que das primeiras vezes, o terrível efeito do gás. Na volta encontramos quatro pessoas desmaiadas, e uma garota passou com um tiro de bala de borracha na nádega. Cachorros e gatos corriam desesperadamente no meio da manifestação, ou entre os carros estacionados, por causa do barulho.
 
Por volta de umas 17, 18 horas muitos dos manifestantes começaram a voltar para o Vale dos Barris, em direção ao Politeama. A polícia pressionava os manifestantes em direção ao Centro. Chegando ao Politeama em frente ao Orixás Center, bombas eram jogadas pelos policias que estavam na Avenida Sete, obrigando que os manifestantes corressem para a Rua Direita da Piedade (passando pelo viaduto) em direção ao Instituto Feminino. Lá encontramos outros manifestantes que subiam pela Rua Politema de Baixo, todos em direção ao Campo Grande.
Chegando ao lado do Forte São Pedro, encontramos em uma das muralhas inúmeros cartazes com as mais diversas reivindicações. Já no Largo do Campo Grande percebemos a triste cena de uma quase guerra. Foi revoltante ver o monumento de 1894 do escultor Carlo Nicoli em homenagem ao Dois Julho, pichado. Nas escadas em mármore carrara tínhamos diversas pichações, e nas bases das esculturas e das luminárias também. Em seguida um pequeno grupo depredou as luminárias dos gradis laterais, e em outro ponto do Largo fizeram fogueiras e barricadas. O Campo Grande parecia estar sitiado.
Monumento ao Dois de Julho pichado.
Imagem: Tayse Argolo. Correio.

O Campo Grande na noite do dia 20 de Junho de 2013.
Imagem: Raul Spinassé | Ag. A TARDE.
 
Os manifestantes se dividiram em direção a Avenida Centenário, Vale do Canela e Corredor da Vitória. Ainda consegui acompanhar parte da manifestação na Orla da Barra indo em direção a Ondina. Alguns comentários mostram que no bairro de Ondina o protesto também foi reprimido, e outras pessoas falaram que parte dos manifestantes conseguiram chegar até o Rio Vermelho.
O 20 de Junho foi marcante na História de Salvador. Lembrei o 2003 e sua Revolta do Buzu. Infelizmente as ações repreensivas por parte da polícia, e os atos de depredação de alguns dos envolvidos nas manifestações, transformaram uma manifestação pacífica, em um cenário triste de um combate covarde. Falaram (não confirmado) que em determinado momento do trajeto, integrantes da Polícia Civil foram aplaudidos pelos manifestantes, por dar passagem a manifestação.
Contudo os tristes acontecimentos não podem jamais enfraquecer o movimento. Devemos seguir e continuar mostrando nossa força, perante um governo que maltrata seu povo, para oferecer a ilusão de um “circo” direcionado para poucos.



O “gigante” precisa continuar caminhando.


Não sou  favorável a depredação. Mas devemos olhar esse depoimento com muita atenção. Muito do que foi dito infelizmente é verdade:
http://www.youtube.com/watch?v=gWSGuHehdkE
Vídeo You Tube. Rosa Ribeiro - "Manifestação em Salvador: O Direito de Resposta"Manifestação Salvador Dia 22 de Junho:
http://rafaeldantasbahia.blogspot.com.br/2013/06/manifestacao-salvador-22-de-junho-de.html



*Atenção. A divulgação dos textos e imagens do blog assinados por Rafael Dantas, Bahia. pode ser feita com a devida referencia do link, nome do autor dos artigos, e nome do Blog. Atenciosamente Rafael Dantas.

2 comentários:

  1. Excelente relato, Rafael. Estive coincidentemente no mesmo grande grupo que o seu, e confirmo cada vírgula do que ocorreu neste fatídico fim de tarde. Lamento bastante o que ocorreu. E mais do que o patrimônio público, me pergunto: O que a PM-BA queria na tarde de ontem? Nos matar? Pois pareceu.

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    1. Obrigado Robson.
      Infelizmente o que pareceu foi isso. Realmente um absurdo! Um triste dia em Salvador, mas que nos alerta. As coisas continuam na mesma situação, ou quem sabe ainda piores.
      Abraço.

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